domingo, 15 de dezembro de 2013

NOVIDADES NA AMÉRICA LATINA?


Gisálio Cerqueira Filho


Chegamos ao fim do ano de 2013 com um percurso percorrido na integração regional na América Latina, não sem sobressaltos e atribulações, com destaque para a América do Sul. O congresso nacional do Paraguai acaba de aprovar o ingresso da Venezuela no MERCOSUL e uma certa convergência de pontos de vista parece ocorrer também entre Argentina, Brasil e Uruguai. Por seu turno, a UNASUL vem realizando esforços para fortalecer a perspectiva sonhada de comunidade imaginada[1] para Nuestra América. Neste aspecto são visíveis as contribuições criativas e inovadoras de Bolívia, Equador e mais recentemente Peru. Em Colômbia, o escritor e cientista político William Ospina nos tem oferecido boas reflexões para a contemporaneidade. Também o filósofo argentino Enrique Dussel, radicado (exilado) desde 1975 no México, tem proporcionado uma revisão da compreensão das revoluções independentistas latino-americanas que, em sua opinião, devem ser elevadas à concepção de evento mundial, nos mesmos termos como fazem, por exemplo, os franceses com a revolução francesa. Todavia, de acordo com Dussel a concepção ética, não exatamente liberal, mas liberadora (“ética da libertação”) deve partir de uma visão latino-americanista com raízes fincadas na América Latina, nas vertentes da crítica da “colonialidade” (colonizador versus colonizado), do indígena, do negro, do mestiço, do republicano, do cosmopolita.
No recente funeral de Madiba (Nelson Mandela), na África do Sul, ouvimos a palavra de Raul Castro: “rendemos emocionado tributo a Nelson Mandela, a quem se reconhece como símbolo supremo de consagración inclaudicable a luta revolucionária pela liberdade e justiça; como um profeta da unidade, da reconciliação e da paz [...] Mandela é um exemplo insuperável para a América Latina e Caribe que avançam com relação à unidade e integração, em benefício de seus povos, respeitosos de sua diversidade, com a convicção de que o diálogo e a cooperação são o caminho para a solução das diferenças e a convivência civilizada com aqueles que pensam diferentemente”.
A expressão consagración inclaudicable assinala a fidelidade aos sonhos e ilusões que nos sustentam no pensamento e na ação, pois la vida es sueño como ensinou Calderón De La Barca.
É nesse contexto que gostaríamos de refletir sobre o papel estratégico que Chile pode vir a representar nesta concertación latino-americana. Chile não é só importante pela sua tradição de lutas em favor da justiça e da paz, nem tão somente pela posição geográfica singular que desfruta. O retorno de Chile ao Estado Democrático de Direito, após tantos anos de intensa repressão política deve ser saudado como grande conquista do continente. E é nesse contexto que o segundo turno das eleições para Presidente da República ganha especial destaque. Após o primeiro turno, duas candidatas apresentaram-se hoje, dia 15 de dezembro de 2013. Michele Bachelet (que vem com 46,6% dos votos) e Evelyn Matthei (com 25,01 %), recentemente obtidos. A vitória esperada de Bachelet (coalização Nova Maioria) contra Matthei já está pautada pelas mídias e é ansiosamente aguardada. Não apenas pela imposição de uma derrota ao Projeto da direita representada pela adversária, filha de militar de alta patente que apoiou ativamente a ditadura de Pinochet. Se isto acontecer, a vitoriosa será uma antiga amiga de infância, também filha de militar de alta patente da Força Aérea, mas que morreu vítima das torturas do regime instaurado após a queda do presidente Salvador Allende.
Muito se espera de uma vitória de Michele Bachelet:
1-                  Uma nova carta constitucional? A maioria alcançada no primeiro turno (68 sobre 120 cadeiras na Câmara e 21 das 38 vagas no Senado) serão suficientes para aprovar as transformações requeridas, aí incluída uma reforma tributária distributivista?
2-                  Avançar nos direitos dos indígenas? Das mulheres? Que outras prioridades nesse campo?
3-                  Governar com o Partido Comunista chileno, num certo revival histórico? Como será isso?
4-                  Atuar nas transformações de um dos mais elitistas sistemas universitários, herdado da ditadura?
5-                  Atuar na modificação explícita do sistema político transformado pela força dos movimentos sociais, especialmente o movimento estudantil, vetor que foi de muitas manifestações recentes e inconformistas?

Mais que tudo, os olhos dos latino-americanos estarão voltados para o quanto a “Nova Maioria” será capaz de apoiar decididamente o MERCOSUL, a UNASUL e outras iniciativas de integração regional capazes de mostrar ao mundo o quanto a luta de Madiba foi efetivamente um farol a iluminar uma nova era para a América Latina.
Às 19h48, em Santiago de Chile, 20h48 em Brasília, com 99,56% das urnas apuradas Bachelet tinha quase 3,5 milhões, ou 62,16%, dos votos, contra 2,1 milhões, ou 37,83%, para Matthei.
Oxalá o NOVO ANO DE 2014 chegue anunciando boas novas para os latimoamericanos!  






[1] Ver “Sulamérica: Comunidade Imaginada - emancipação e integração”. Anais do XI Congresso Internacional do Fórum Internacional do Mercosul (FoMERCO), Buenos Ayres, 2010. Niterói: Editora da UFF [Universidade Federal Fluminense], 2011, 367 pp. Vários autores.