quinta-feira, 27 de setembro de 2012



Eleições lá e cá
Gisálio Cerqueira Filho

Muitas pessoas reclamam que, no Brasil, o voto eletrônico não venha acompanhado de um recibo e não tenha a garantia do voto impresso simultâneo ao eletrônico. Isto num país em que sabidamente são grandes os avanços na área da informatização, sobretudo, do sistema bancário. Pois na Venezuela o ex-presidente dos EUA Jimmy Carter elogiou o sistema de votação venezuelano por incluir duas formas de contagem. Segundo ele, isso dificulta qualquer tipo de tentativa de fraude. Naquele país, os eleitores escolhem o seu candidato em uma urna eletrônica e ainda recebem um comprovante, que é depositado em uma caixa vedada, aberta para confirmar os resultados eleitorais. Além disso, um dos dedos é manchado com tinta indelével. Jimmy Carter coordena uma instituição de monitoramento de eleições ao redor do mundo há mais de uma década. Em conferência anual do Carter Center, o ex-presidente norte-americano assegurou a lisura dos procedimentos com relação ao pleito em vias de realizar-se no país que acaba de ingressar no Mercosul.
            Como se não bastassem, tais informações nos chegam acompanhadas de um reconhecimento forte de que, preferências ideológicas à parte, os investimentos realizados a partir das receitas oriundas do petróleo tem diminuído o padrão de desigualdade social neste país. Essa constatação não exclui o debate acerca de uma das críticas da oposição: a de que os acordos de cooperação na área petrolífera fiquem comprometidos com os benefícios e os agrados aos que apoiam a revolução bolivariana. Alguns oposicionistas chegam a falar em sucateamento da PDVSA, empresa estatal de petróleo. E, todavia, a ONU declarou no mês passado que a Venezuela é o país com menos desigualdade social na América Latina. Além da UNESCO ter assegurado números relativamente confortáveis no que concerne à alfabetização e educação.
Os que apoiam Capriles contra Chavez põem as barbas de molho pois sabem que as possibilidades do pré-sal brasileiro apontam para fortes investimentos sociais a partir da exploração do petróleo na plataforma submarina. Além do que, os debates entre Barack Obama e Mitt Romney acerca dos investimentos sociais estatais, com olhos no voto latino-americano no pleito eleitoral norte-americano, autorizam e liberam as hipóteses de legitimidade tanto dos investimentos estatais na Venezuela (as chamadas missões bolivarianas) quanto o portfólio de bolsas governamentais brasileiras que sabidamente tem produzido frutos seja na incorporação de alguns milhões de despossuídos nas classes médias baixas, seja no avanço das classes médias propriamente ditas, com a incorporação social de milhões de descendentes afro-brasileiros.
Assim, lá (nos EUA), como cá (no Mercosul), desprezar políticas públicas de diminuição da desigualdade social é desprezar tanto o voto latino (nos EUA) quanto o voto dos pobres e despossuídos (no Mercosul). É um tiro no pé e o melhor atalho para a derrota eleitoral seja nas eleições presidenciais norte-americana e venezuelana; seja na eleição municipal brasileira.  O que não significa dizer que estar atento a isso basta para vencer as eleições.
Sobretudo, o mais interessante é o quanto isso autoriza a entrada na cena política dos mais pobres como protagonistas.
Cada vez mais vemos homens e mulheres vindos dos extratos mais empobrecidos da população chegando às universidades, aos shoppings, aos bens de consumo, às viagens aéreas, às novas subjetividades...  Mas aspiram em primeiro lugar à voz pública e à participação político-social. Incluem-se e são incluídos como cidadãos.
As lideranças diversas, porém comprometidas com uma certa dose de protagonismo popular como de Barack Obama, Hugo Chavez e Luiz Inácio Lula da Silva não podem, pois ser desprezadas ou descartadas. Elas vieram para ficar, por mais que contrariem interesses mais estabelecidos ou sejam menos cortejadas pelas mídias, que, por seu turno, também vão mudando...
Significativos setores intelectuais nos EUA e na Europa tem reconhecido o papel importante que o Brasil tem desempenhado na redução da pobreza.
Entretanto, há ainda muito por fazer. É o que a Presidenta Dilma Rousseff tem dito nos fóruns nacionais e internacionais.

segunda-feira, 17 de setembro de 2012

FoMERCO e MERCOSUL

Gisálio Cerqueira Filho

Sob a presidência da Professora Ingrid Sarti (UFRJ), atualmente na UNILA (Universidade Federal da de Integração Latino-americana), reúne-se o Fórum Universitário Mercosul (FoMERCO) para o seu XIII Congresso Internacional. O tema do encontro será “Por uma integração ampliada da América do Sul no século XXI” e ocorrerá com os auspícios da Alta Representação Geral do Mercosul, associado ao Instituto Cultural BrasilUruguay (ICBU).
O encontro será acolhido pelo Centro de Formación para la Integración Regional (CEFIR) e pela Universidad de la República del Uruguay (Udelar), e será realizado no Edifício Sede do Mercosul, em Montevidéu, de 21 a 23 de novembro de 2012.
Em assim sendo, os preparativos para o congresso já estão ocorrendo e nos solicitam algumas palavras nesta hora crucial na região.
São muitas as questões a exigir reflexão e certamente as mais recentes são a suspensão do Paraguai e a entrada da Venezuela no MERCOSUL. Seguramente a evolução dos acontecimentos estará fortemente condicionada pelo processo eleitoral a acontecer em ambos os países e, sobretudo, o resultado eleitoral propriamente dito. A integração ampliada da América do Sul depende muito, com certeza, dos acontecimentos políticos antes do fim ano de 2012, inclusive o resultado eleitoral nos EUA.
Todavia, nossas reflexões, às vésperas dos diversos pleitos, concentram-se precisamente nas relações comerciais entre Brasil e Argentina. Ambos os países, esteios do Mercosul, passam por dificuldades e sofrimentos. A Argentina mira uma fase na economia que a compromete com barreiras comerciais que afetam decisivamente as exportações brasileiras. No cenário em marcha não se exclui a elevação das taxas de inflação e até a instabilidade política diante de múltiplas circunstâncias políticas que já começam a tomar forma. Recentemente as ruas de Buenos Aires foram tomadas por um panelaço e buzinaço que anunciam novas manifestações estrepitosas. E com acusações recíprocas das forças governistas e de oposição.
De abril a julho de 2012 as vendas do Brasil caíram US$ 6,1 bilhões sobre igual período de 2011 e tão somente os argentinos foram responsabilizados por  32 % da redução. Corresponde a US$ 1,96 bilhão das compras de produtos brasileiros. Comparativamente falando, a União Europeia, na presente situação de crise, importou menos 27% do total do tombo das vendas brasileiras.
A variação para baixo aconteceu em praticamente todas as categorias (bens duráveis, não duráveis, combustíveis, bens de capital e intermediários). As maiores perdas foram na indústria, sobretudo em bens de capital (-14%) e de bens de consumo duráveis (-12%), dos quais os principais compradores são os argentinos, com 60% do total exportado pelo Brasil.
Que a redução está relacionada a barreiras comerciais impostas pela Argentina não há dúvida. Todavia, muitos economistas dizem que isso se deve ao alvo argentino de encerrar o ano de 2012 com superávit comercial. A troca de produtos chineses pelos produtos brasileiros tem sido um verdadeiro achado na conjuntura econômica argentina. Dificuldades correntes de crédito internacional, o que não é o caso do Brasil, parece oferecer ao parceiro do Mercosul esta saída “chinesa”, que talvez ofereça oportunidade de ouro ou seja seria verdadeiramente um “negócio  da China”.
Todavia muitos sociólogos e cientistas políticos dizem que isso poderá minar a credibilidade da integração econômica e permitir fissuras no bloco.
Qualquer que seja a reflexão de natureza econômica ou mesmo comercial deve levar em consideração muito atenta as relações de confiança recíproca que foram alcançadas e que não devem ser lançadas ao mar. Esse é um patrimônio que deve ser consolidado e ampliado.

* Gisálio Cerqueira Filho é ex-presidente do FoMERCO.